Williams reativa gasodutos NESE e Constitution para reduzir crise energética no Nordeste EUA

Em um cenário onde a transição energética global e os debates sobre descarbonização tendem a polarizar o discurso

Em um cenário onde a transição energética global e os debates sobre descarbonização tendem a polarizar o discurso público, a gigante norte-americana Williams Cos (WMB) faz um movimento pragmático e revelador: a tentativa de reviver dois projetos-chave de gasodutos de gás natural entre Pensilvânia e Nova York. Com isso, acende um alerta de oportunidade e risco para investidores atentos à matriz energética dos Estados Unidos e ao jogo regulatório que envolve tanto forças políticas quanto os mercados financeiros.

Os projetos em questão — o Northeast Supply Enhancement (NESE) e o Constitution Pipeline — são veteranos em batalhas jurídicas, ambientais e políticas. Ambos foram arquivados nos últimos anos por conta da recusa de licenças ambientais por parte de reguladores estaduais, especialmente em Nova York e Nova Jersey. A Williams cancelou o Constitution Pipeline em 2020, após anos de impasse com o estado de Nova York, e o NESE em 2024, quando encontrou barreiras tanto em Nova York quanto em Nova Jersey. Entretanto, as recentes movimentações indicam que a conjuntura está mudando.

No centro desse reposicionamento está o apoio tácito do governo Trump, que volta a ocupar o cenário regulatório com maior vigor, e uma mudança de tom por parte da governadora de Nova York, Kathy Hochul. Ainda que Hochul não tenha declarado apoio explícito aos projetos da Williams, ela afirmou que o estado está disposto a trabalhar em conjunto com o governo federal e com o setor privado para viabilizar projetos que se alinhem à legislação estadual. A fala, embora diplomática, é interpretada como uma brecha para a reavaliação de antigos embargos.

De fato, em maio, o secretário do Interior dos EUA, Doug Burgum, revogou uma ordem de paralisação das obras do parque eólico offshore Empire Wind, da norueguesa Equinor. Isso evidenciou que o ambiente político está se ajustando não apenas em favor da energia renovável, mas também para garantir a segurança energética e a estabilidade no fornecimento de gás.

Neste contexto, a Williams enviou uma petição formal à Comissão Federal de Regulação de Energia (FERC) para restabelecer o certificado de conveniência e necessidade pública do projeto NESE, além de já estar retomando tratativas com reguladores ambientais dos três estados envolvidos — Pensilvânia, Nova York e Nova Jersey — para garantir as licenças necessárias à execução dos projetos.

Por trás dessa movimentação técnica e jurídica está uma realidade econômica: a região Nordeste dos EUA enfrenta há anos restrições logísticas no fornecimento de gás natural, o que eleva os custos para os consumidores e força o uso de combustíveis mais poluentes, como o óleo combustível. É uma contradição estrutural que afeta tanto a competitividade econômica quanto a agenda ambiental. A Williams, portanto, se posiciona como solução para um problema estrutural, com potencial de impactar diretamente as tarifas energéticas e os padrões de emissão da região.

Essa ressurreição dos gasodutos, embora cercada de incertezas, aponta para três dimensões estratégicas que devem ser cuidadosamente observadas pelos investidores:

Primeiro, o papel dos Estados na agenda energética. A decisão da governadora Hochul de flexibilizar a postura ambientalista diante da crise energética local revela o limite prático do ativismo climático quando confrontado com a realidade das contas de energia dos eleitores. Se por um lado o discurso verde ainda é dominante em círculos políticos, por outro, a pressão por estabilidade e modicidade tarifária pode abrir espaço para soluções convencionais como o gás natural.

Segundo, o retorno da política energética realista à esfera federal. A nova postura do governo Trump representa um choque de pragmatismo, priorizando segurança energética e infraestrutura em detrimento da ideologia verde. Nesse ambiente, projetos antes considerados politicamente inviáveis voltam à mesa como instrumentos de equilíbrio econômico.

Terceiro, o impacto sobre o mercado de capitais. A reativação dos projetos da Williams deve ser acompanhada de perto por investidores em energia, infraestrutura e utilities. O movimento pode criar novas oportunidades de capitalização, valorização de ativos e rearranjos estratégicos em carteiras expostas ao setor. Afinal, um gasoduto operando entre a Pensilvânia — rica em gás de xisto — e os centros consumidores de Nova York representa um vetor logístico com forte retorno financeiro, desde que superadas as barreiras regulatórias.

A Williams, com isso, dá sinais de que está disposta a apostar alto no novo ciclo político e regulatório. Não se trata apenas de recuperar projetos arquivados, mas de assumir protagonismo em uma nova fase da matriz energética dos EUA. A empresa demonstra capacidade de articulação com diferentes níveis de governo, domínio técnico e disposição para navegar em águas turvas com foco em entregas concretas.

Vale lembrar que o setor de energia nos Estados Unidos está cada vez mais dividido entre a promessa de um futuro 100% renovável e a necessidade de garantir resiliência energética no presente. O gás natural, nesse cenário, aparece como combustível de transição, mais limpo do que o carvão e o óleo combustível, mas ainda longe de ser isento de críticas ambientais. Mesmo assim, os dados falam por si: enquanto os projetos NESE e Constitution dormem nas gavetas da burocracia, o Nordeste norte-americano paga caro pela importação de energia e continua utilizando fontes ultrapassadas e poluentes.

Por fim, a postura da Williams reflete uma convicção empresarial clara: a demanda por gás natural no Nordeste dos EUA não vai desaparecer tão cedo. O crescimento populacional, a densidade urbana e a necessidade de aquecimento nos meses de inverno mantêm a região como um mercado de alta demanda. A infraestrutura atual, no entanto, está longe de atender à necessidade total — e é nesse vácuo que os projetos NESE e Constitution encontram sua razão de ser.

Em tempos de transição energética e volatilidade geopolítica, a retomada de projetos de infraestrutura não é um retrocesso, mas sim uma adaptação às condições reais do mercado. A Williams compreendeu esse jogo com clareza e está se antecipando ao novo ciclo político e regulatório que se desenha nos Estados Unidos.

Para o investidor estratégico, o momento é de atenção redobrada. A reativação dos gasodutos pode representar uma reprecificação dos ativos de infraestrutura, uma oportunidade de entrar em um ciclo de valorização ainda na fase pré-operacional. Além disso, os desdobramentos jurídicos e políticos dos próximos meses serão determinantes para balizar expectativas e riscos regulatórios.

Investir em energia, sobretudo em infraestrutura pesada como gasodutos, exige visão de longo prazo, apetite por risco e leitura acurada do cenário político. A Williams está mostrando que acredita nesse caminho. Resta saber se o mercado, e os investidores brasileiros atentos às oportunidades globais, saberão acompanhar esse movimento com o mesmo grau de ousadia e pragmatismo.

Com informações Reuters

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