Tanure faz oferta ousada pela Braskem e pode mudar o rumo da indústria química

A tentativa de Nelson Tanure de assumir o controle da Braskem é mais do que uma simples movimentação

A tentativa de Nelson Tanure de assumir o controle da Braskem é mais do que uma simples movimentação empresarial — trata-se de um gesto calculado e emblemático de como o capital estratégico está sendo realocado no Brasil. Em um cenário marcado por incertezas econômicas e uma indústria nacional em constante pressão, a proposta apresentada por um fundo ligado ao empresário reacende o debate sobre o papel da iniciativa privada no futuro de ativos industriais críticos para o país.

A Braskem, gigante petroquímica brasileira, comunicou oficialmente ao mercado que recebeu da Novonor (antiga Odebrecht) informações sobre uma proposta não vinculante de venda do controle acionário, feita por meio do fundo Petroquímica Verde, controlado por Tanure. Trata-se de uma oferta ambiciosa, com compromisso de exclusividade nas negociações, e que aponta diretamente para o controle efetivo da companhia. O objetivo explícito é se tornar o titular indireto das ações que hoje garantem o poder de decisão da Braskem — 50,1% do capital votante ainda sob domínio da Novonor.

A movimentação, confirmada horas após reportagens da imprensa adiantarem a investida, provocou reação imediata no mercado: as ações da BRKM3 subiram mais de 9% na B3, liderando o Ibovespa com a maior valorização do dia. O comportamento dos papéis evidencia o quanto a possível mudança de controle animou investidores — e também o quanto essa empresa segue no radar de grandes nomes do mercado financeiro nacional e internacional.

A Novonor, atolada em dívidas desde os desdobramentos da Operação Lava Jato, tenta vender sua participação na Braskem há anos. Desde as primeiras rodadas de negociação, nomes como a Adnoc, de Abu Dhabi, a norte-americana LyondellBasell, a brasileira Unipar Carbocloro e o grupo J&F (dos irmãos Batista, da JBS) já passaram pelas mesas de negociação, sempre sem sucesso. Agora, surge Tanure, com um perfil bastante distinto: um investidor oportunista, especializado em empresas em crise, com histórico de reestruturações agressivas e reorganizações profundas.

Em nota à imprensa, Tanure tentou acalmar os ânimos e posicionar-se como um parceiro de longo prazo para a indústria nacional. “Nosso compromisso é com o longo prazo, com a indústria nacional e com a construção de uma Braskem ainda mais forte”, declarou. Porém, há quem veja a operação com desconfiança, justamente por seu perfil de investidor que aposta em ativos depreciados e os transforma com cortes, renegociações e venda de partes estratégicas.

O jogo, no entanto, ainda não está ganho. A Petrobras, que detém 47% do capital votante da Braskem, precisará aprovar a operação. Procurada pela imprensa, a estatal não comentou o caso, mantendo o padrão de silêncio institucional típico em momentos de negociações sensíveis. Ainda assim, Tanure deixou claro que sua proposta pressupõe uma atuação conjunta com a estatal, afirmando que “não há futuro promissor para a Braskem sem uma atuação conjunta, construtiva e duradoura ao lado da Petrobras”.

Na visão pragmática do mercado, essa fala não é apenas uma gentileza diplomática. A Braskem, com fábricas e operações em diferentes estados, enfrenta hoje desafios estruturais que exigem articulação com agentes públicos e privados. Um exemplo emblemático é o passivo ambiental em Alagoas, que Tanure classificou como “o primeiro grande obstáculo a ser superado para destravar valor”. O desastre geológico em Maceió, causado por décadas de exploração de sal-gema, representa uma bomba-relógio jurídica e financeira que precisa ser resolvida antes que qualquer plano de expansão tenha credibilidade junto a investidores institucionais.

Em segundo plano, mas não menos relevante, o empresário traça uma estratégia ambiciosa: transformar o polo de Camaçari, na Bahia, em um centro de inovação da petroquímica verde no Brasil. Isso colocaria a Braskem em linha com as megatendências globais de sustentabilidade, bioeconomia e transição energética. Além disso, projeta a potencialização do polo do Rio de Janeiro, com ênfase no uso sustentável do gás do pré-sal, em parceria com a Petrobras — uma combinação que pode dar musculatura à Braskem em um mercado internacional cada vez mais exigente com a matriz energética das indústrias.

Por fim, a terceira frente anunciada por Tanure é um velho conhecido dos analistas financeiros: o desafio de reduzir a alavancagem. Com uma dívida líquida relevante, especialmente após os anos difíceis da controladora Novonor, a Braskem precisa urgentemente de um plano robusto para reorganizar sua estrutura de capital. Uma redução da alavancagem financeira não apenas fortalece a governança da empresa, como aumenta sua capacidade de atrair investimentos estratégicos em áreas de inovação e expansão.

O que torna essa movimentação particularmente interessante é o perfil do próprio Tanure. Ele não é um industrial tradicional. Seu histórico inclui participações e reestruturações em empresas como a Light (energia elétrica), a Prio (petrolífera) e a construtora Gafisa — todas marcadas por momentos turbulentos, com reviravoltas intensas e, em muitos casos, resultados financeiros que surpreenderam o mercado. Seu estilo é direto, seu apetite por risco é notório, e sua capacidade de lidar com credores, sindicatos e reguladores já foi testada mais de uma vez.

Se bem-sucedida, a operação poderá marcar uma das transações mais simbólicas do capitalismo brasileiro recente. Afinal, trata-se da transição de uma gigante nascida no seio do setor público (a partir de integrações envolvendo ativos da Petrobras e da antiga Odebrecht) para um controle privado ainda mais consolidado, com uma proposta de reestruturação audaciosa. Para o investidor de perfil pragmático, essa transição representa uma janela de oportunidade, desde que os riscos sejam bem precificados.

Por ora, os detalhes da proposta não foram tornados públicos — nem valores, nem condições específicas, tampouco os prazos esperados para a conclusão da negociação. A própria natureza “não vinculante” da proposta revela que ainda há muito jogo pela frente. Entretanto, o compromisso de exclusividade firmado entre Tanure e a Novonor mostra que, ao menos por ora, os concorrentes foram deixados à margem.

Para os acionistas minoritários da BRKM3, o momento exige cautela e análise. Caso a transação se concretize, é provável que ocorram reprecificações dos ativos, tanto por expectativas de melhora operacional quanto por eventuais mudanças estratégicas, que podem incluir a venda de ativos não essenciais, fusões ou cisões, ou mesmo uma reformulação completa da estrutura de comando da companhia.

O mercado acompanha com atenção cada passo de Tanure, e os sinais indicam que esta é apenas a primeira peça de um tabuleiro muito maior. A eventual aprovação pela Petrobras, o desfecho das negociações com credores e o tratamento do passivo ambiental serão determinantes para definir se a Braskem renascerá como uma potência da petroquímica verde, ou se permanecerá prisioneira de um passado marcado por dívidas, escândalos e oportunidades desperdiçadas.

Para os leitores do Open Investimentos, a mensagem é clara: monitorar a evolução deste negócio é essencial para entender os rumos da indústria petroquímica no Brasil — e, mais amplamente, para captar os sinais de transformação que o capital nacional está passando. O nome de Tanure carrega com ele tanto a promessa da eficiência quanto o risco da instabilidade. E, como sempre, é neste ponto de tensão que as melhores oportunidades costumam surgir.

Com informações Reuters

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